Já há algum tempo venho ensaiando um artigo sobre o tão famoso NDVI ou “Índice de Vegetação por Diferença Normalizada – IVDN“; sempre me soa estranho que algo apresentado na primeira disciplina (literalmente) da Graduação, no longínquo ano 2000 – “Interpretação de fotografias aéreas e imagens orbitais” – ainda seja visto por muitos como algo complexo ou mesmo como capaz de “salvar a lavoura”.
Principalmente na Agricultura de Precisão e Digital temos ouvido falar muito, quase como um índice mágico, para usos além daquele a qual ele – assim como outros índices de vegetação – são propostos e aplicados, levando a mapas e imagens visualmente interessantes, mas que levantam dúvidas ao tomador de decisão e decepção aos gestores quanto às reais possibilidades com o Tratamento e Processamento Digital de Imagens, com expectativas desalinhadas quanto às Geotecnologias.
Para além das ondas no setor de tecnologia, os índices de vegetação – assim como qualquer cálculo e produção de informação a partir de sensores imageadores – se antes eram de difícil acesso e extremamente complexos, hoje estão em plataformas online, amparadas em conceitos estado-da-arte como o WebGIS. Não são, assim, uma tendência, mas um ferramental básico e uma competência essencial quando tratamos de Agricultura Digital.
Este vídeo apresenta a utilização de ferramentas WebGIS (Google Earth Engine) para acesso ao NDVI (Normalized Difference Vegetation Index) e detecção de padrões espaciais
Nas últimas semanas, conheci o blog do nepalês Bikesh Bade (Engenheiro e Explorador), com artigos e tutoriais de uso do Google Earth Engine, Pandas e outras tecnologias aplicadas a diversos temas do Sensoriamento Remoto. A partir deste, encontrei no site da Earth Observing System (EOS) o artigo completo “Tudo que você precisa saber sobre NDVI”: entrei em contato e, com autorização para tradução, apresento não tudo que há sobre NDVI, mas o que você precisa saber para discutir e buscar novos materiais e conhecimento sobre o tema. Muitos dos pontos aqui apresentados podem -e devem – ser discutidos e contrapostos a outras visões/cálculos/metodologias.
Ao longo do artigo – dividido em duas partes – teço comentários, adiciono algumas explicações e imagens, além de recomendações de leituras e vídeos, buscando não ser uma tradução direta e sim a base de um artigo que sempre ficou no rascunho.
Por que o NDVI?
O NDVI talvez seja o índice de vegetação mais comumente usado no Sensoriamento Remoto (e suas aplicações, como na Agricultura), sendo um dos exemplos didáticos iniciais nas áreas de ensino superior ligadas às Geotecnologias, desde sua introdução nos anos `70 do século passado. Com o aumento da disponibilidade (e acesso) às imagens obtidas de Sensores Remotos (como satélites e drones), mais e mais pessoas começaram a adotar o NDVI como um cálculo além de seu escopo científico.
O Agronegócio há anos vem alavancando inovações nas chamadas Geotecnologias: além de ser um dos maiores consumidores de tecnologias para posicionamento (GNSS), é uma das indústrias que mais utiliza efetivamente os produtos informacionais de satélites, drones e outros, com grande acurácia e ótima cobertura territorial e temporal.
E, mesmo com seu tempo de utilização e discussão bibliográfica, ainda há divulgação de muitas informações errôneas (principalmente em tutorais rápidos e demonstrações pirotécnicas) e descrença de alguns sobre este e outros “índices misteriosos”. Pensando nisto, este artigo propõe uma rápida discussão sobre o NDVI, em formato Perguntas & Respostas.
1. O que é um Índice de Vegetação?
Segundo Liu (2007;2015), cada objeto (alvo) na superfície terrestre apresenta uma curva singular de energia no espectro eletromagnético, conhecida como assinatura espectral. Com esta característica física dos objetos, é possível identificar e separar (classificar) uma imagem em diferentes classes, como a clássica figura 1 apresenta: vegetação, solo e água.
Figura 1 – Resposta Espectral de Vegetação Solo e Água. Fonte: MORAES (2002)
A reflectância espectral permite que a vegetação seja detectada e medida por sensores em diferentes bandas, possibilitando a classificação de seus elementos, como presença de plantas ou árvores, seu estado geral, e outras chaves temáticas.
Assim, um Índice de Vegetação é a combinação matemática de duas ou mais dessas bandas espectrais que destaca diferentes padrões, como vegetação (com alta reflectância) e solo exposto, estruturas artificiais etc., além de quantificar algumas características da vegetação, como biomassa, vigor e densidade; existem centenas de índices para análise de vegetação e demais aplicações nas Geociências.
2. O que é o NDVI no Sensoriamento Remoto?
O Índice de Vegetação de Diferença Normalizada é um indicador da biomassa fotossinteticamente ativa ou, em termos mais simples, o cálculo da saúde da vegetação.
3. O que o NDVI possibilita?
O NDVI ajuda a diferenciar a vegetação de outros tipos de cobertura da terra (como alvos não-naturais) e sua condição geral, bem como identificar e classificar áreas cultivadas em mapas temáticos, auxiliando na detecção de mudanças em padrões e anormalidades no processo de desenvolvimento.
4. Como o NDVI é calculado?
Por meio da diferença entre a reflectância das bandas infravermelho próximo (NIR) e do vermelho (Red), dividida pela soma das duas reflectâncias, sendo expresso matematicamente como NDVI = (NIR-Red) / (NIR+Red).
A partir da relação matemática entre as bandas infravermelho próximo e vermelho, é possível inferir sobre a saúde da vegetação, pois o NDVI possui relação intrínseca com as propriedades vegetativas, especialmente a biomassa, ou seja, a capacidade fotossintética e absorção de energia pela copa (ou dossel superior) das plantas.
5. Se você precisar calcular o NDVI, que bandas você deverá utilizar?
Conforme visto na fórmula, é necessário utilizar como fonte de dados o valor da reflectância de duas bandas: a vermelha visível e a infravermelho próximo. Sempre importante lembrar que não é possível calcular o NDVI utilizando usando imagens em cores naturais (como as disponibilizadas no Google Earth/Google Maps) ou outro tipo de composição/fusão de bandas, mesmo que elas contenham as faixas necessárias.
Figura 2 – Resposta da vegetação no vermelho visível e infravermelho próximo. Fonte: EOS (2019)
Mas, por que “se precisar”? Hoje, grande parte das plataformas orbitais e outros players do mercado já disponibilizam por meio de webservices/apps, o NDVI processado, como o Google Earth Engine. Para o cálculo, a partir das imagens (raster), diversos softwares e ferramentas estão disponíveis, proprietárias e livres, ou mesmo processamentos em nuvem.
6. Como o NDVI funciona?
Por meio da comparação matemática entre a quantidade de luz vermelha visível absorvida e a infravermelho próximo refletido pela vegetação, conforme a figura 3. E aqui está o porquê:
A clorofila em uma planta saudável absorve a maior parte da luz vermelha visível, enquanto sua estrutura celular reflete a maior parte do infravermelho próximo. Isso implica que a alta atividade fotossintética – comumente relacionada à vegetação densa – terá menor reflectância na banda vermelha e maior reflectância na banda infravermelho próximo. Observando como esses valores se comparam, é possível detectar e analisar com segurança a cobertura vegetal separadamente de outras classes de cobertura da terra.
Figura 3 – Resposta da vegetação em diferentes bandas e condições. Fonte: Cole (2020)
7. Qual valor NDVI apresenta a vegetação saudável: positivo ou negativo?
O NDVI, de maneira geral, é calculado com intervalo de classificação (range) entre -1,0 e +1,0: valores negativos correspondem às áreas com corpos d’água, estruturas artificiais, rochas, nuvens e neve.
O solo exposto (ou solo nu) geralmente tem valor NDVI de 0,1 a 0,2; a vegetação sempre terá índices positivos entre 0,2 e 1. O dossel superior da vegetação densa e saudável geralmente apresenta valores acima de 0,5 e a vegetação esparsa terá valores entre 0,2 e 0,5 (associadas à vegetação em crescimento). A figura 4 auxilia o entendimento com a comparação entre o índice digital classificado e uma imagem em campo.
Entretanto, não há regras e tabelas prontas! Estes são somente alguns intervalos gerais e não levam em consideração a estação do ano, tipo de vegetação e características regionais. A investigação de campo permanece essencial.
Figura 4 – Valores NDVI classificados na imagem e seus testemunhos de campo. Fonte: OneSoil (2020)
8. Como medir a densidade da vegetação com NDVI?
Na maioria dos casos, os valores NDVI entre 0,2 e 0,4 correspondem a áreas com vegetação esparsa; vegetação intermediária tende a ter valores entre 0,4 e 0,6; qualquer classificação acima de 0,6 indica uma alta possibilidade de folhas verdes.
Em análise de áreas cultivadas com NDVI, é obrigatório levar em consideração o tipo de cultura e a largura das linhas ao interpretar os resultados obtidos.
Figura 5 – Valores NDVI consagrados na bibliografia para vegetação. Fonte: EOS (2019)
Observação importante: o problema com o NDVI como ferramenta para medir a densidade da vegetação é que os valores tendem a saturar em áreas com grandes quantidades de biomassa (verde).
Em linhas gerais, são geralmente obtidas leituras similares dos valores NDVI tanto para baixa como para muito alta densidade de vegetação. Considere utilizar o EVI (Enhanced Vegetation Index), que é uma versão ajustada do NDVI, com maior acurácia especialmente em áreas com copas densas. O NDRE (Normalized Difference Red Edge) também é um índice alternativo, sugerido para culturas permanentes e densas.
9. Como interpretar as imagens/mapas de NDVI?
Tradicionalmente, os resultados do NDVI são apresentados em imagens classificadas por métodos contínuos, variando de 0-255 em imagens 8 bits, onde cada cor corresponde a um certo valor digital. Não há uma paleta de cores padrão para o NDVI, mas é comum o uso do tradicional “vermelho-verde”, onde o vermelho, laranja e amarelo indicam solo exposto ou vegetação morta/esparsa, e todos os tons de verde são sinais de cobertura vegetal densa.
Sempre faça a leitura atenta do mapa digital/dashboard ou produto que está sendo consumindo, incluindo a legenda. Também observe se não estão sendo aplicados filtros ou consultas.
10. Como o NDVI pode ser utilizado na Agricultura?
Esta lista não é exaustiva e muitos artigos e publicações discutem profundamente aplicações, usos, possibilidades e limites no uso do NDVI para a Agricultura. São as principais aplicações do NDVI para a Agricultura (de Precisão, Digital, 4.0).
Estimar a biomassa e avaliar o estado e a saúde das culturas
Identificar pragas, doenças, fungos ou manchas excessivamente sem respostas espectrais no campo, antes que o dano seja definitivo
Analisar a dinâmica da vegetação ao longo de suas fases de desenvolvimento e crescimento
Estabelecer condições normais de cultivo para as culturas em Zonas de Manejo por meio de séries temporais de NDVI
Apoiar as estimativas de produtividade – nunca sozinha, apenas combinada com outros parâmetros usados para previsão!
Definir Zoneamentos de maneira mais rápida, permitindo boas práticas no uso de água, nutrientes nas culturas e pesticidas, com eficiência e eficácia.
Monitorar condições e produtividade das pastagens
Monitorar a seca e auxiliar na previsão de áreas de risco de incêndio
11. Bonus: Poderia citar algumas alternativas ao NDVI?
Na verdade, existem uma série de índices de vegetação, sendo grande parte baseado no NDVI. Como diferencial, eles possuem ajustes para brilho solo, efeitos atmosféricos e outros fatores que afetam normalmente os resultados NDVI. Exemplos: EVI, SAVI, ARVI, GCL, SIPI
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